domingo, 12 de outubro de 2008

Poema da despedida

Não saberei nunca
dizer adeus

Afinal,
só os mortos sabem morrer

Resta ainda tudo,
só nós não podemos ser

Talvez o amor,
neste tempo,
seja ainda cedo

Não é este sossego
que eu queria,
este exílio de tudo,
esta solidão de todos

Agora
não resta de mim
o que seja meu
e quando tento
o magro invento de um sonho
todo o inferno me vem à boca

Nenhuma palavra
alcança o mundo, eu sei
Ainda assim,
escrevo
.

Autor:Mia Couto

Foto: BoroG

sábado, 11 de outubro de 2008

A Casa Quieta



"Quero acreditar que já não estarias em casa por alturas em que cheguei mas não sei dizer. A verdade é que não te procurei. Mais uma vez. Penso que fiz as coisas do costume, penso hoje quando penso nisso que fiz as coisas do costume, terei deixado o sobretudo ao acaso, abri o frigorífico fechei abri uma outra vez, sem saber bem o que procuro, acontece-me quase sempre. As coisas do costume. Vagueei sem saber bem, o sobretudo caído alguém há-de arrumar, tu tratas disso. Do frigorífico abro fecho abro outra vez, quero pouco, não sei que quero, deixei de beber prometi-te acho que te prometi, não sei que beba."


Autor:-Rodrigo Guedes de Carvalho
Excerto :A Casa Quieta
Foto:Mabar

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

sentei-me


sentei-me sem a presença do destino,um quase nada…pousado na bruma, deixei que tudo me invadisse,foi então que voei…
.
Autor:Almaro
Foto:Laluna Bel

terça-feira, 7 de outubro de 2008

são

São duas e tal da madrugada e tenho medo
Tu já não estás comigo.
Hoje deito-me só.
Levanto-me só
Quero dormir não consigo, sinto a falta de ti na distância do meu abraço.
Tu sabes que gosto de te sentir.
Descansar a minha mão em ti
Beijar-te pela madrugada enquanto dormes sorrindo.
Olhar-te
Tu sabes e já não estás.
E sinto frio o teu lado da cama
E sinto esta cama tão grande sem ti.
E tu não estás!
E eu amo-te.
É mais forte que eu.
Este sentir amordaçado…
.
Autor: joão marinheiro

Foto:Paulo César http://www.paulocesar.eu/ - paulo cesar

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

...

a bruma da minha cidade é um retalho de dor, cada pedaço é uma cor, cada tom uma vida. passeio-me só, sem lua nem lobo, entre a luz e a sombra de cada uma. vagabundo navegante sem cidade nenhuma…
.
Autor:Almaro
Foto:Beatrice

domingo, 5 de outubro de 2008

Nas minhas mãos...

Nas minhas mãos
Deslizo no teu corpo...
As minhas mãos trémulas.
Percorro as linhas
De uma escultura perfeita,
E no suor da tua pele
Perco o medo de sentir.
Um momento único
De cada segundo que passa!
Nos meus dedos
Levo a inocência,
De um amor banido
Que se oculta,
Na textura do prazer
O estado natural do inconsciente.
Deslizo no teu corpo...
As minhas mãos pertencentes
Das sensações deslumbrantes,
Que a minha boca cala
Num beijo único.
Dois corpos despidos
Que se enaltecem de formosura
Nas minhas mãos...
.
Autor: Conceição Bernardino
Em "Alma Poética"
Página 19
Foto:Konradluczenczyk
.

um selo

um prémio atribuido a este blogue por
http://atilasiqueira.blogspot.com/
obrigada.

sábado, 4 de outubro de 2008

Noite

Eu vivo
nos bairros escuros do mundo
sem luz nem vida.
Vou pelas ruas
às apalpadelas
encostado aos meus informes sonhos
tropeçando na escravidão
ao meu desejo de ser.
São bairros de escravos
mundos de miséria
bairros escuros.
Onde as vontades se diluíram
e os homens se confundiram
com as coisas.
Ando aos trambolhões
pelas ruas sem luz
desconhecidas
pejadas de mística e terror
de braço dado com fantasmas.
Também a noite é escura.

Autor:Agostinho Neto
Foto: bornslippy

domingo, 28 de setembro de 2008

Perdão

Peço perdão às letras,
Por pouco saber escrever.
Peço perdão à vida,
Por não saber viver.
Peço perdão ao amor,
Por amar sem querer.
Peço perdão ao mundo,
Por não saber nele viver.
Peço perdão aos Deuses,
Por não saber lhes compreender.
Peço perdão à vida,
Por ter vontade de morrer.
Peço perdão a tudo,
Por nada ser.
Peço perdão,
E só perdão,
Por ser um tolo,
E nada na vida entender.

Autor:Átila Siqueira.
http://atilasiqueira.blogspot.com/
Foto:Paulo Madeira
Paulo Madeira - www.paulomadeira.net

sábado, 27 de setembro de 2008

Lençois de Algas

Sonho-te em lençóis de algas
Na água que acaricia
Teu corpo
Que te inunda e permanece
Por breves instantes
Em ritmos cadenciados
Sonho-te
Nas areias derramadas
Cálidas como
Este amor pagão
Cheio de sal e mar
Sonho-te
Neste golpear de horizontes
Em que me arrebato
Em barcos de papel
Onde navego nos ósculos
Carregados de doçura
Sonho-te
Meu segredo
Camuflado numa melodia
Tão intangível
Tão perfeita e completa
Que ninguém a conseguirá tocar
Sonho-te
Entorpeço
Tombo
Soergo-me
E adormeço
Para voltar a sonhar-te....
.
Autor:© Piedade Araújo Sol
Poiesis
Volume XV-Editora Minerva
Pág.195
Foto:amku


sexta-feira, 26 de setembro de 2008



(quero-te assim

longínquo e doce

terno e ausente)

só posso desejar-te nas palavras
.

Autor:Maria Aurora Carvalho Homem

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Memória



é de ti que eu falo
hoje
quando todos os pássaros emigram do Outono
para as cidades destruídas
quando os olhos marítimos de conhecerem as margens
do sul se fecham devagar
é de ti que eu falo.

Lembras-te?

era Janeiro e eu vinha do norte.
a casa vermelha tinha janelas azuis e à volta
um tempo de vinhas e canções longínquas.

estávamos sós.

Lembras-te?

então o pai atravessava o cais
a paravam os estios da ilha
o ventos do atlântico queimavam os lábios
e le dizia:

cesce filho corre filho
pra onde irei para onde?

e ele dizia:
aí há barcos barcos
ehavia barcos barcos.

Lembras-te?

Autor :José Agostinho Baptista
Desde lado onde - 1976
Foto:Miara Jakub

domingo, 7 de setembro de 2008

a casa onde às vezes regresso

a casa onde ás vezes regresso é tão distante
da que deixei pela manhã
no mundo
a água tomou o lugar de tudo
reúno baldes, estes vasos guardados
mas chove sem parar há muitos

.
durmo no mar, durmo ao lado de meu pai
uma viagem se deu
entre as mãos e o furor
uma viagem se deu: a noite abate-se fechada
sobre o corpo
.
tivesse ainda tempo e entregava-te
o coração
.
Autor:José Tolentino Mendonça
Foto:Stefers

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

sem nome

Eu a esperar-te. O tempo a passar lento. Demoramos. As mesas vazias. O café vazio. Eu a esperar-te. Eu a imaginar-te. Tu a chegares. Tu a chegares. Tu a caminhares. Tu a sorrires. Tu a murmurares. Desculpa – estou atrasada! O tempo a começar a andar. Tu a ficares próxima. Eu a admirar-te. Tu a sorrires. Espécie de sol na minha vida. Eu a olhar-te. O tempo a andar mais depressa. Eu a querer-te. Tu nem por isso. O sol nos teus olhos. Eu a querer apanhar o sol. Tu quase a partires. O tempo a correr. Tu a saíres pela porta. Eu parado. O tempo que voa agora. Foste embora de novo. Eu a tropeçar na saudade. O sol a esconder-se. Eu a descer a rua ao contrário. Tu para norte. Eu para sul. Eu a querer-te. Tu nem por isso. Eu num café numa cidade qualquer. Uma mesa qualquer. Uma chávena vazia. A mesa vazia. Eu vazio. Um vazio imenso. Um silêncio imenso. Eu vazio de ti. Eu a esperar-te de novo. O tempo a passar lento outra vez. Eu a perder a vez. O sol a ir também. A noite em mim. O silêncio que chega. Eu a esperar-te ainda. A não dizer que te amo. O amor adiado. Eu a querer-te. Tu nem por isso.
.
Autor:João marinheiro 02/08/08


Foto:Wilktors

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

ah, sobre ausência escrevi isso:

a distância não te separa
nem a ausência
nem o silêncio
porque me mandas estrelas
sóis de outros sistemas
e beijos azuis molhados
porque sinto tuas gotas de orvalho
como se de repente
me transformasse
sem amarílis, orquídea, miosótis
ou em qualquer flor
que exale aroma
também azul(não sei nome de flor azul)porque me recrias dos cincos elementos
presentes em tuas palavra
se carregando um sexto sentido
já te pressinto em mim
homem azul.

(foi escrito para um poeta)


Autor:Pavitra
http://metamorfraseando.blogspot.com/
Foto:J.P.Sousa