sexta-feira, 5 de agosto de 2022

Verbo

 

Tudo o que sou, sou apenas aquilo que não sou

O mar revolto, uma ilha deserta,
Um ponto parágrafo a contornar uma nova história ou uma vírgula em ascensão.
Talvez a derrota ou uma qualquer vitória.
Enfermo desajeitado com cariz de deputado.
Não importa o que sou, mas quem sou...
Uma hera a impedir as fissuras negras da velha parede,
O colapso do verbo inacabado,
Um futuro incerto num passado inesperado,
Um desenho rabiscado, a flor que ainda não rasgou a terra.
Sou chuva, sol e erva,
Lágrima de um ser desconhecido,
Amendoeira em flor, canto do canto ainda não parido.
Sou gaveta por abrir, malmequer desfolhado,
Sou tudo aquilo que ainda não fui,
Sou tudo aquilo que sou,
Uma reza em pecado, um peregrino desolado...
Sou a fúria que carrego na mão e este corpo despido.
Sou nada, nada do que sou, porque o que sou, simplesmente sou.

Autor : Conceição Bernardino
In - "o murmúrio dos impiedosos"
Imagem :Hayley Roberts

1 comentário:

Cidália Ferreira disse...

O poema é tão belo quanto a imagem!!
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As palavras são o ponto de encontro

Bom fim de semana. Beijo