sábado, 19 de junho de 2021

A Demora

 


O amor nos condena:
demoras
mesmo quando chegas antes.
Porque não é no tempo que eu te espero.

Espero-te antes de haver vida
e és tu quem faz nascer os dias.

Quando chegas
já não sou senão saudade
e as flores
tombam-me dos braços
para dar cor ao chão em que te ergues.

Perdido o lugar
em que te aguardo,
só me resta água no lábio
para aplacar a tua sede.

Envelhecida a palavra,
tomo a lua por minha boca
e a noite, já sem voz
se vai despindo em ti.

O teu vestido tomba
e é uma nuvem.
O teu corpo se deita no meu,
um rio se vai aguando até ser mar.

Autor : Mia Couto, in " idades cidades divindades
Imagem : Kristina Makeeva

1 comentário:

Cidália Ferreira disse...

Um poema fascinante!:))
-
Traço as linhas do meu horizonte
-
Beijos, e um excelente fim de semana.