quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Luz



Talvez que noutro mundo, noutro livro,
tu não tenhas morrido
e talvez nesse livro não escrito
nem tu nem eu tenhamos existido

e tenham sido outros dois aqueles
que a morte separou e um deles
escreva agora isto como se
acordasse de um sonho que

um outro sonhasse (talvez eu),
e talvez então tu, eu, esta impressão
de estranhidão, de que tudo perdeu
de súbito existência e dimensão,

e peso, e se ausentou,
seja um sonho suspenso que sonhou
alguém que despertou e paira agora
como uma luz algures do lado de fora.

Autor : Manuel António Pina, in «Todas as Palavras - Poesia Reunida»

2 comentários:

Dilmar Gomes disse...

Poema bem trabalhado. Um abraço. Tenhas um bom dia.

Manuel Veiga disse...

sonho e realidade - um começa um e termina o outro?

responda quem souber...

beijo