Eric Zener
Acordo sem o contorno do teu rosto na minha almofada, sem o
teu peito liso e claro como um dia de vento, e começo a erguer a madrugada
apenas com as duas mãos que me deixaste, hesitante nos gestos, porque os meus
olhos partiram nos teus.
E é assim que a noite chega, e dentro dela te procuro,
encostado ao teu nome, pelas ruas álgidas onde tu não passas, a solidão aberta
nos dedos como um cravo.
Meu amor, amor de uma breve madrugada de bandeiras, arranco
a tua boca da minha e desfolho-a lentamente, até que outra boca — e sempre a
tua boca — comece de novo a nascer na minha boca.
Que posso eu fazer senão escutar o coração inseguro dos
pássaros, encostar a face ao rosto lunar dos bêbados e perguntar o que
aconteceu.
Autor : Eugénio de Andrade
in 'Poesia e Prosa [1940-1980]'
1 comentário:
Sempre o nosso Eugénio
Enviar um comentário