domingo, 26 de outubro de 2008

Pergunta-me


Pergunta-me
se ainda és o meu fogo
se acendes ainda
o minuto de cinza
se despertas
a ave magoada
que se queda
na árvore do meu sangue

Pergunta-me
se o vento não traz nada
se o vento tudo arrasta
se na quietude do lago
repousaram a fúria
e o tropel de mil cavalos

Pergunta-me
se te voltei a encontrar
de todas as vezes que me detive
junto das pontes enevoadas
e se eras tu
quem eu via
na infinita dispersão do meu ser
se eras tu
que reunias pedaços do meu poema
reconstruindo
a folha rasgada
na minha mão descrente

Qualquer coisa
pergunta-me qualquer coisa
uma tolice
um mistério indecifrável
simplesmente
para que eu saiba
que queres ainda saber
para que mesmo sem te responder
saibas o que te quero dizer

Autor:Mia Couto

Foto:KxxG


1 comentário:

Átila Siqueira. disse...

Um belo poema, e em perfeita harmonia com a imagem que a ilustra. Gostei muito das rimas e da forma como o verso foi construído, com bastante intensidade e sensibilidade.

Me visite depois Beatrice, ando com saudade de seus comentários.

Um grande abraço,
Átila Siqueira.