sexta-feira, 31 de julho de 2015

Janela Corporal


Zin Limit

Abro a janela do teu corpo
Afasto as vestes dos teus cabelos
Acaricio os degraus do teu seio
E digo-te…
Vem murmúrio doce
A manhã é eterna quando se ama!

Autor : José Luís Outono
in Mar de Sentidos (Ed. Vieira da Silva, 2012)

quinta-feira, 30 de julho de 2015

Coisas Tuas


Levo coisas tuas
para poder estar contigo
na distância.
Para nunca te perder a companhia,
mesmo não estando.
Levo gravado o teu gesto,
o pranto, o riso, e,
(ora inocente, ora picante),
o teu sorriso,
que é a tua expressão,
o teu maior encanto.
E levo um objecto,
teu pertence,
como se o espaço tivesse autoridade
e o tempo nos afastasse.

Como se fosse preciso...

Autor: Margarida Faro
In 44 Poemas (Fonte da Palavra 2011)

quarta-feira, 29 de julho de 2015

Quero o teu corpo

Nishe

Vejo o teu corpo
deitado no ar que respiro
humedecido de estrelas.

Sinto o teu corpo
de luar que me incendeia
no frio da insónia.

Ouço o teu corpo
Ao sol e à chuva, que afago baixinho
Com mãos de guitarra.

Cheiro o teu corpo
tépido e branco, que me inebria
com pérolas vivas.

Provo o teu corpo
oásis de mim, que ocupo sedento
cheio de água da paz.

Quero o teu corpo
da alma trajado, que anseio ditoso
e arrebatado.

Autor : Jaime Portela
http://riosemmargenspoesia.blogspot.pt/

domingo, 26 de julho de 2015

....



Dissolvi o tempo em pedaços de ilusões,
desdobrei-me em utopias.

E o dia pachorrento seguiu seu curso
Ignorando a minha sede de  aventura.

Deixem-me só, com os olhos cerrados
eu encontrarei o (meu) caminho.
.
BeatriceMar 2013-05-12
Reeditado
foto GNP


sábado, 25 de julho de 2015

...

julie de waroquier

entro pela primeira vez no quarto onde
fechaste a porta devagarinho e foste
morrer de mim como se morre
de doença que ninguém espera
e por momentos ainda acredito que
o nosso tempo é este que o relógio guarda
embora saiba que nunca
há relógios certos para o tempo
de quem nos abandona
e as sombras que as persianas desenham nas paredes

servem apenas para tentar salvar a vida de quem
vai regressar em teu lugar

e nem entende por que o chamaram

Autor : Alice Vieira
in OS Armários da Noite(Caminho 2014)

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Pecado Original


Corsino António Fortes 
 Mindelo, 14 de Fevereiro de 1933
Mindelo, 24 de Julho de 2015

Passo pelos dias
E deixo-os negros
Mais negros
Do que a noute brumosa.

Olho para as coisas
E torno-as velhas
Tão velhas
A cair de carunchos.

Só charcos imundos
Atestam no solo
As pegadas do meu pisar
E fica sempre rubro vermelho
Todo o rio por onde me lavo.

E não poder fugir
Não poder fugir nunca
A este destino
De dinamitar rochas
Dentro do peito...

Autor :Corsino Fortes
(Claridade, 1960

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Pequeno Poema

Gustav Klimt
quando eu nasci
ficou tudo como estava.
Nem homens cortaram veias,
nem o Sol escureceu,
nem houve estrelas a mais...
Somente,
esquecida das dores,
a minha Mãe sorriu e agradeceu.
Quando eu nasci,
não houve nada de novo
senão eu.
As nuvens não se espantaram,
não enlouqueceu ninguém...
Pra que o dia fosse enorme,
bastava
toda a ternura que olhava
nos olhos de minha Mãe...


Autor: Sebastião da Gama
in Antologia Poética(edição póstuma)

domingo, 19 de julho de 2015

A Tonalidade das Palavras

aynur Guçlu

As palavras também têm sábados e dores de cabeça e uma história real na construção do mundo.
As palavras entristecem com a nossa fala. E nós enlouquecemos sem elas. Porque o mundo são palavras.
As cores são palavras. A palavra primavera floresce em nossa boca. E a palavra mar faz de quem a pronuncia, uma ilha encantada.
Quando parto sem palavras, uma tristeza vai comigo a doer-me no sangue, na raiz da fala e do afecto.
Só elas podem explicar o mistério do amor.
Delas retiro o ouro, o trigo, a fala e a esperança. Nelas vive o tigre e a esmeralda. Delas sopra o vento.
São curandeiras. Feiticeiras. Mensageiras. Deusas.
São o canto da alma e a voz que falta às andorinhas.
E o sorriso do anjo. E a única coisa que Deus não inventou.
São essas palavras que ficam mudas no coração da gente para que os beijos possam dizer o que elas não dizem.


Autor : Joaquim Pessoa,
in “Guardar o Fogo”

sexta-feira, 17 de julho de 2015

MIra Nedyalkova

há qualquer coisa que me faz desejar-te,
ser qualquer coisa num qualquer lugar teu;
que me faz regressar de qualquer parte.

há qualquer coisa em ti que produz qualquer coisa em mim,
uma qualquer coisa que não encontra um simples fim;
qualquer coisa que simplesmente me ilumina o escuro,
me preenche de qualquer forma, em coisas de alheado,
e que me faz lembrar qualquer coisa sobre o futuro,
qualquer coisa como: ter um qualquer mais cuidado....

Autor: Henrique Caldeira dos Santos

quinta-feira, 16 de julho de 2015

A língua sobre a pele o arrepio

fabrizia milia

A língua sobre a pele o arrepio
Os teus dedos nas escadas do meu corpo

As lâminas do amor o fogo a espuma
A transbordar de ti na tua fuga

A palavra mordida entre os lençóis
As cinzas de outro lume à cabeceira

Da mesma esquina sempre o mesmo olhar:
Nada do que era teu vou devolver.

Autor : Alice Vieira
in Dois corpos tombando na água

quarta-feira, 15 de julho de 2015

Estamos tão sós


Laura Makabresku


O que nos afasta
uns dos outros
é o que nos aproxima
uns dos outros. Este
ser ao mesmo tempo
um e outro. Este ser
ao mesmo tempo
todo e parte desse
todo. Estamos tão
sós quando nos
bastaria apenas ser.

Autor : luís ene

segunda-feira, 13 de julho de 2015

Está tudo bem mãe

Kamil Vojnar

Está tudo bem, mãe,
estou só a esvair-me em sangue,
o sangue vai e vem,
tenho muito sangue.

Não tenho é paciência,
nem tempo que baste
(nem espaço, deixaste-me
pouco espaço para tanto existência).

Lembranças a menos
faziam-me bem,
e esquecimento também
e sangue e água a menos.

Teria cicatrizado
a ferida do lado,
e eu ressuscitado
pelo lado de dentro.

Que é o lado
por onde estou pregado,
sem mandamento
e sem sofrimento.

Nas tuas mãos
entrego o meu espírito,
seja feita a tua vontade,
e por aí adiante.

Que não se perturbe
nem intimide
o teu coração,
estou só a morrer em vão

Autor : Manuel António Pina


sábado, 11 de julho de 2015

Dor


Seu nome esqueci sim
Só dói quando chamo
Por mim

Autor : Alice Ruiz

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Perdi as mãos por tão pouco

lukrecja czerwon ajcio

Perdi as mãos por tão pouco.
Por uma gota da água dos teus olhos,
pelo rumor na tua boca,
pelo ciciar dos ventos nas muralhas.
perdi as mãos por tão pouco…
Ficou-me a fome na boca,
fome de quem nada deseja
para além da antemanhã.
Acho um a um os meus dedos
delgados, ventos nos cabelos,
as palmas das mãos tão sulcadas,
tão leito onde as águas se demoram.
Com as minhas mãos perdidas
encontro branca
a nudez das tuas.
Com elas brinca
a fragrância da madrugada.


Autor : Lília Tavares
in PARTO COM OS VENTOS (Kreamus, 2013)

quarta-feira, 8 de julho de 2015

por ti deitei o meu corpo ao mar

Elena Kalis
por ti deitei o meu corpo ao mar
sem cuidar que a maré me esquecesse
por ti aprendi como as coisas se tocam
como o trigo entende o vento e a terra
como amanhecem as crianças sobre as mães

por ti dormi no sobressalto dos vales
entre sossegos mudos e noites espessas
por ti toquei a gravidez das nuvens
toquei os filhos semeados no inverno
toquei a mulher que espanta o frio

e imaginei que me ouvisses na distância
que me lembrasses a meio do mês branco
quando nos campos as pétalas escrevem
o teu nome quando a mão anuncia a ternura
que é quando os meus olhos procuram os teus


Autor : Vasco Gato
in Um mover de mão, Assírio & Alvim, 2000

segunda-feira, 6 de julho de 2015

...




Percorro
o mesmo caminho
uma e outra vez


e o mesmo caminho
uma e outra vez
conduz-me


a diferentes

e estranhos
locais





Autor : luís ene