terça-feira, 30 de abril de 2019

Não me importo com as rimas

Adam Bird.
.
Não me importo com as rimas. Raras vezes 
Há duas árvores iguais, uma ao lado da outra. 
Penso e escrevo como as flores têm cor 
Mas com menos perfeição no meu modo de exprimir-me 
Porque me falta a simplicidade divina 
De ser todo só o meu exterior 
Olho e comovo-me, 
Comovo-me como a água corre quando o chão é inclinado, 
E a minha poesia é natural como o levantar-se vento... 

Autor : Alberto Caeiro
in "O Guardador de Rebanhos - Poema XIV" 
Heterónimo de Fernando Pessoa

domingo, 28 de abril de 2019

todos os dias

elena dudina.

todos os dias, renovo as minhas esperanças,
e se não há o verde, eu procuro outras cores,
nas vozes que me ciciam interiormente.
.
Autor : BeatriceM 28-04-2014

sábado, 27 de abril de 2019

O pão


Há pessoas que amam
Com os dedos todos sobre a mesa.
Aquecem o pão com o suor do rosto
E quando as perdemos estão sempre
Ao nosso lado.
Por enquanto não nos tocam:
A lua encontra o pão caiado que comemos
Enquanto o riso das promessas destila
Na solidão da erva.
Estas pessoas são o chão
Onde erguemos o sol que nos falhou os dedos
E pôs um fruto negro no lugar do coração.
Estas pessoas são o chão
Que não precisa de voar.

Autor  :  Rui Costa

sexta-feira, 26 de abril de 2019

Caso

Richard Blunt.
.
Pode ser mais um capricho 
pode ser uma paixão 
pode ser coisa de bicho 
pode não. 

Pode ser já por destino 
pelos astros, pelos signos 
por uma marca, uma estrela 
talvez já estivesse escrito 
na palma da minha mão. 

Talvez não... 

Talvez até nem fique 
nem signifique nada 
nem me arranhe o coração 
pode ser só uma cisma 
pode estar só de passagem 

Ou não.

Autor : Bruna Lombardi

quinta-feira, 25 de abril de 2019

25 de Abril


Clara manhã esta que me abraça
Na esperança da madrugada nunca acabada
Do chão lavrado e da semente
Germinada na mente de linda gente.

Abril sempre...

Autor :LuísM Castanheira

quarta-feira, 24 de abril de 2019

Vai com cuidado

eduard gordeev
.

há na cidade uma despedida
de malas feitas
e documentos falsos

há bilhetes suicidas
e mal-entendidos
nos nomes das ruas

não há mais saída:
o rio que me beba
o corpo bêbado

não há tempo
para curar um porre
entre uma ponte e a morte.

Autor : Anna Clara de Vitto


Anna Clara de Vitto. Poeta. Santista radicada em São Paulo. Participa da coordenação do Clube da Escrita para Mulheres. Possui poemas publicados em algumas revistas online, tais como Fazia Poesia e Algo deu Errado, iniciativa dos alunos do Curso Livre de Preparação do Escritor – CLIPE, Casa das Rosas, turma de 2018. Publicará em breve seu primeiro livro de poesias e, enquanto banca uma Penélope meio Ariadne e se concentra na tarefa, frequenta saraus e leituras. Blog: www.medium.com/@annaclaraescreve

domingo, 21 de abril de 2019

Domingo de Páscoa



Hoje é dia de alegria, porque Jesus ressuscitou e porque a esperança se renova em nossos corações.

É dia de gratidão para com Jesus que morreu na cruz para nos salvar.

E é dia de usar roupa nova e bonita cheia de cores, como dizia a minha mãe.

Um Domingo de Páscoa feliz para todos.

BeatriceM

sábado, 20 de abril de 2019

Sábado Santo, o dia do silêncio

O Sábado Santo é o dia entre a dor pela morte de Jesus e a alegria da sua ressurreição. A comunidade está em silêncio, à espera, também recordando a perplexidade dos apóstolos após a morte de Cristo. Os protagonistas são o recolhimento e a meditação.

sexta-feira, 19 de abril de 2019

Sexta-Feira Santa

larawan ng mahal na araw
.
Neste dia, podemos também meditar, com profundidade, as “sete palavras de Cristo na Cruz” antes de sua morte. É como um testamento d’Ele:

“Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem”;
“Em verdade te digo: hoje estarás comigo no Paraíso”;
“Mulher, eis aí o Teu filho (…) Eis aí a Tua Mãe”;
“Tenho Sede!”;
“Eli, Eli, lema sabachtani? – Meu Deus, Meu Deus, por que Me abandonastes?”;
“Tudo está consumado!”;
“Pai, em tuas mãos entrego o meu Espírito!”.

quinta-feira, 18 de abril de 2019

Paz aos Mortos

Detestei sempre os arquitectos de infinito: 
como é feio fugir quando nos espera a vida! 
Nunca tive saudades do futuro 
e o passado... o passado vivi-o, que fazer?! 
- e não gosto que me ordenem venerá-los 
se eu todo não basto a encher este presente. 

Não tenho remorsos do passado. O que vivi, vivi. 
Tenho, talvez, desprezo 
por esta débil haste que raramente soube 
merecer os dons da vida, 
e se ficava hesitante 
na hora de passar da imaginação à vida. 

As pazadas de terra cobrindo o que já fui 
sabem mal, às vezes; noutros dias 
deliro quando lanço à vala um desses seres tristonhos 
que outrora fui, sem querer. 

Autor : Adolfo Casais Monteiro
in 'Sempre e Sem Fim' 

quarta-feira, 17 de abril de 2019

...

Bogna Patrycja Altman
.

Ou me perco aqui ou fujo daqui. Por uns tempos, preciso de recuar, preciso de ir ver outros caminhos. Preciso de um campo aberto para as lágrimas, preciso da distância de um lugar secreto, de uma memória, se calhar da distância de uma oração. Preciso de me ir embora daqui.

Autor: Maria João Lopo de Carvalho
In Adopta-me

terça-feira, 16 de abril de 2019

O Relógio


"Diante de coisa tão doida
Conservemo-nos serenos

Cada minuto da vida
Nunca é mais, é sempre menos

Ser é apenas uma face
Do não ser, e não do ser

Desde o instante em que se nasce
Já se começa a morrer."


Autor : Cassiano Ricardo
Foto: Kianzoo

domingo, 14 de abril de 2019

Esqueci

Tantas vezes me dizias que me amavas
 E eu sabia que era mentira 
Mas fingia e acreditava
 Porque nada tinha senão as tuas palavras

 Esqueci 
 As esperas a imaginar
 As chegadas 
Que eram apenas partidas 
 Apenas promessas em palavras

 Esqueci

 As datas
 Os locais
 Tanta mentira que quando
 Se transformou em verdade 
Eu pensei que era mentira

 E simplesmente esqueci

E esqueci-te


Autor : BeatriceM reeditado 2012-03-25
Foto: Roberto Liang

sábado, 13 de abril de 2019

O valor das Coisas

Ashraful Arefin
.
O valor das coisas,
Não está no tempo que elas duram,
Mas na intensidade com que acontecem.

Por isso,
Existem momentos inesquecíveis,
Coisas inexplicáveis,
Pessoas incomparáveis.

Autor  : Fernando Pessoa

sexta-feira, 12 de abril de 2019

no gesto

Maksim Kuzin
.
Este é um tempo de silêncio.
Tocam-te apenas.
E no gesto te empobrecem de afeto.
No gesto te consomem.
Tocaram-te, nas tarde, assim como tocaste,
adolescente, a superfície parada de umas águas?
Tens ainda nas mãos a pequena raiz,
A fibra delicada que a si se construía em solidão?

Autor : Hilda Hilst

quinta-feira, 11 de abril de 2019

.

Richard Blunt

Trocaria a memória de todos os beijos que me deste por um único beijo teu. E trocaria até esse beijo pela suspeita de uma saudade tua, de um único beijo que te dei.

Autor : Miguel Esteves Cardoso

quarta-feira, 10 de abril de 2019

Medo

mara light

O medo, essa força misteriosa que nos rouba a alegria e o sonho, devia vir no dicionário como antónimo de vontade.

O medo é como um terreno minado; nunca o atravessamos mesmo que do outro lado estejam todos os nossos desejos.

Autor : Margarida Rebelo Pinto
in "Diário da Tua Ausência"

terça-feira, 9 de abril de 2019

Mamãe eu quero ser de água

Joan Carol
-

Mamãe,

Eu quero ser de prata.

Filho,
Terás muito frio.

Mamãe,
Eu quero ser de água.

Filho,
terás muito frio.

Mamãe,
Borda-me em tua almofada.

Isso sim!
Agora mesmo!

Autor: Gabriel Garcia Lorca

domingo, 7 de abril de 2019

Que fizemos

absentia
.
Que fizemos dos nossos sonhos, e dos
beijos que trocamos, quando nada era proibido
e tu vinhas à noite por entre as árvores da praça
e eu esperava-te no café da esquina.

Hoje somos dois estanhos que se refugiam
na melancolia dos dias, e quando te procuro
com o olhar por entre as árvores da praça
é apenas uma sombra que imagino.

mas nunca és tu

Autor : BeatriceM 2012/04/01

sábado, 6 de abril de 2019

Adeus na hora da largada

Vik Muniz
.
Minha Mãe
(todas as mães negras
cujos filhos partiram)
tu me ensinaste a esperar
como esperaste nas horas difíceis

Mas a vida
matou em mim essa mística esperança

Eu já não espero
sou aquele por quem se espera


Sou eu minha Mãe
a esperança somos nós
os teus filhos
partidos para uma fé que alimenta a vida

Hoje
somos as crianças nuas das sanzalas do mato
os garotos sem escola a jogar a bola de trapos
nos areais ao meio-dia
somos nós mesmos
os contratados a queimar vidas nos cafezais
os homens negros ignorantes
que devem respeitar o homem branco
e temer o rico
somos os teus filhos
dos bairros de pretos
além aonde não chega a luz elétrica
os homens bêbedos a cair
abandonados ao ritmo dum batuque de morte
teus filhos
com fome
com sede
com vergonha de te chamarmos Mãe
com medo de atravessar as ruas
com medo dos homens
nós mesmos

Amanhã
entoaremos hinos à liberdade
quando comemorarmos
a data da abolição desta escravatura

Nós vamos em busca de luz
os teus filhos Mãe
(todas as mães negras
cujos filhos partiram)
Vão em busca de vida.

Autor :  Agostinho Neto

sexta-feira, 5 de abril de 2019

Criação Sonhada

Bogna Patrycja Altman
.
Tanto
tempo a pensar
divino esforço
que adormecendo
deus sonhou consigo:

Sonhou braços e pernas
e cabeças,
sonhou paisagens
de mental pudor
conversas calmas
com o quase feito

E esforçado ficou
e exausto se quedou
ao ver-se assim traído
pela obra criada

Só em sonho

Autor : Ana Luísa Amaral

quinta-feira, 4 de abril de 2019

Conserto a palavra

Natália Drepina
.
Conserto a palavra com todos os sentidos em silêncio 
Restauro-a 
Dou-lhe um som para que ela fale por dentro 
Ilumino-a 

Ela é um candeeiro sobre a minha mesa 
Reunida numa forma comparada à lâmpada 
A um zumbido calado momentaneamente em exame 

Ela não se come como as palavras inteiras 
Mas devora-se a si mesma e restauro-a 
A partir do vómito 
Volto devagar a colocá-la na fome 

Perco-a e recupero-a como o tempo da tristeza 
Como um homem nadando para trás 
E sou uma energia para ela 

E ilumino-a 

Autor : Daniel Faria
 in "Homens que São como Lugares Mal Situados"

quarta-feira, 3 de abril de 2019

..

chegas de novo a casa
e guardas do tempo a fuga
marcas outra vez os dias
para abrir feridas

como se viesse dos pássaros a acusação
de não saberes medir esquecimentos

respiras até à dor para não sentires mais nada

Autor : Maria Sousa
em Exercícios para endurecimento de lágrimas
Lisboa: Língua Morta, 1ª edição, 2010, p.26.

terça-feira, 2 de abril de 2019

Oceano Nox

Junto do mar, que erguia gravemente
A trágica voz rouca, enquanto o vento
Passava como o voo dum pensamento
Que busca e hesita, inquieto e intermitente,

Junto do mar sentei-me tristemente,
Olhando o céu pesado e nevoento,
E interroguei, cismando, esse lamento
Que saía das coisas, vagamente…

Que inquieto desejo vos tortura,
Seres elementares, força obscura?
Em volta de que ideia gravitais?

Mas na imensa extensão, onde se esconde
O Inconsciente imortal, só me responde
Um bramido, um queixume, e nada mais…

Autor : Antero de Quental