quarta-feira, 31 de julho de 2019

....

Logan Zillmer

a casa é feita de gestos
e a solidão é um vazio
que quase se consegue tocar

o quarto, o corredor, a sala
tudo faz parte desta geografia
do vazio

e se de repente o telefone tocasse
e fosse a tua voz?

Autor : Maria Sousa

terça-feira, 30 de julho de 2019

Cantiga

Nas ondas da praia
Nas ondas do mar
Quero ser feliz
Quero me afogar.

Nas ondas da praia
Quem vem me beijar?
Quero a estrela-d'alva
Rainha do mar.

Quero ser feliz
Nas ondas do mar
Quero esquecer tudo
Quero descansar.

Autor:Manuel Bandeira
(Estrela da Manhã)
Imagem : Richard Blunt

sábado, 27 de julho de 2019

Colherei as estrelas para ti...


Pelas flores que não te dei…
Aguardo-te ao luar
e no céu dos sonhos
colherei as estrelas para ti.

Autor : António Carlos Santos
Imagem : Tullius Heuer

sexta-feira, 26 de julho de 2019

Teus Olhos


Não me deixes manter meus pés acima das ondas
mas antes me deixe no mergulho dos teus olhos
Pois sou teu céu
Pois és meu mar.


Autor : Adriana Magalhães em 19/06/2015
Código do texto: T5282498 
Classificação de conteúdo: seguro
Recanto das letras
Imagem : Jenna Martin

quinta-feira, 25 de julho de 2019

-

Que você seja alegre mesmo quando vier a chorar.
Que você seja sempre jovem, mesmo quando o tempo passar.
Que você tenha esperança, mesmo quando o sol não nascer.
Que você ame seus íntimos, mesmo quando sofrer frustrações.
Que você jamais deixe de sonhar, mesmo quando vier a fracassar.
Isso é ser feliz.
Que através deste livro você garimpe ouro dentro de si mesmo.
E seja sempre apaixonado pela vida.
E descubra que você é um ser humano especial.

Autor : Augusto Cury
Imagem : Marius Markowski

quarta-feira, 24 de julho de 2019

NEM TODO VERBO

nem todo verbo
há de sangrar
na vértebra
também com anestesia
se há de se ir
dissecá-lo

para que não se perca
a parte dentro do nome
o que se desgruda por último
a margem ao redor do nome
o que perscruta em nossa boca
a ausência do pronome

 Autor  : Vera Lúcia de Oliveira
(Do livro A chuva nos ruídos, Escrituras, 2004, São Paulo (Prêmio de Poesia da Academia Brasileira de Letras, 2005).
Imagem : Lora Zombie

terça-feira, 23 de julho de 2019

Ave do Silêncio


Sobre a paisagem verde
ficou uma sombra
- a sombra do meu vulto
a erguer-se em silêncio
e a sumir-se pela terra dentro.

E a luz que a perde
e a queima, a própria luz
a revela ao oculto,
- e assim me crucifico
na minha própria cruz.

Autor: António de Navarro
Imagem : Logan Zilmer

domingo, 21 de julho de 2019

O dia apagou-se

O dia apagou-se.

Algures,
a noite invadiu um  quarto vazio,
onde um corpo se contrai
num fogo
carente de ternura
como água fresca a germinar
duma nascente.

Os pássaros dormem nos seus ninhos.


BeatriceM 2014-07-13(reeditado)
ImagemMarius Markowski

sábado, 20 de julho de 2019

Poética

Que é a poesia?
uma ilha
cercada
de palavras
por todos os lados

Que é o poeta?um homem
que trabalha o poema
com o suor do seu rosto
um homem
que tem fome
como qualquer outro
homem.

Autor : Cassiano Ricardo (São José de Campos, Brasil, 
             26/6/1895 – Rio de Janeiro, 14/1/1974)
             Poeta, ensaísta, jornalista, licenciado em Direito.´
Imagem: Logan Zilmer

sexta-feira, 19 de julho de 2019

»


"Por mais que me custe aceitar, o meu porto de abrigo já não passa por ti. Na verdade, não passa por ninguém, temos de o encontrar dentro de nós, ou estaremos perdidos para sempre."

Autor: Margarida Rebelo Pinto

quinta-feira, 18 de julho de 2019

Um dia


Um dia a lua vai criar uma sombra só para mim. Numa dessas noites de gatos, noites de estrelas pousadas, a sombra será um presente lunar. E os vastos braços da sombra quebrarão o mar, repartirão as ondas. Serei um homem com amparo de sombra e luz de pedra, com faróis esperando-me como um rei no exílio. Um dia a lua irá quebrar todas as promessas e dar-me a sombra que me conduzirá entre pátios e ruelas, como um mendigo, como um mapa, como névoa, como rei deposto e imenso.

Autor : Bernardino Guimarães
Imagem : Anna Hollerer

quarta-feira, 17 de julho de 2019

..


agora que o amanhã é apenas
ficar mais velha
no meio das pausas e dos passos pelo corredor

a tua ausência não mudou o lugar de nada
e há palavras que ocupam cada vez mais espaços

vivo neste tempo de casas dispersas
e tenho medo de sair

Autor : Maria Sousa
Imagem: Cristina Coral

terça-feira, 16 de julho de 2019

...


Tua mão sobre os meus lábios colocas
Para que, do que sinto, nada mais diga,
E assim pedes que avance, que prossiga,
Quando com a boca na minha pele tocas.
...
Vacilo, mas tu, versada, a mão deslocas
Mirando-me de um modo que m’intriga,
Que m’excita, que a ser ousado m’obriga
Para ter de ti o que de mim também invocas…
Por instantes, hesitamos, algo impede
O consumar do desejo que m’arrebata,
Algo que tão bem sabes que só sucede
Quando esse teu olhar no meu constata 
Que este que sou tudo de ti quere e pede,
O que logo dás por de mim te sentires grata…

Autor : Luís Corredoura dixit
Imagem: Omar Ortiz

domingo, 14 de julho de 2019

A tarde


A tarde, caiu, impediosa, e a noite ocupou a minha visão que se prolonga pelo mar.
Eu sei que pode parecer estranho, mas eu gosto de contar os meus segredos ao mar.
Sei que nunca obtenho respostas, mas, por vezes, sou eu que o abraço nessas cumplicidades.
E quando as lágrimas caem e se confundem com as ondas, eu sinto-me completamente purificada.
.
BeatriceM 2012-07-08 (reeditada)
Foto : MaciekPorto

sábado, 13 de julho de 2019

O Segredo e o Mistério

Anya Anti.
.
Mistérios a pouco e pouco vão morrendo 
e extenuados de vigília os anjos
são afinal a sussurrantes sibilinas vozes
que desvendam adivinham segredos
atrás de sentinelas
cuja ferocidade é uma ironia de ternura…
Na palidez da luz
cercando uma velha cabeça
a quem um sono de embrião já tolda os olhos
sorriem enigmáticos os sonhos.

Autor : Edmundo Bettencourt
in 'Antologia Poética'

sexta-feira, 12 de julho de 2019

.....

Brooke Shadenn

Há um dia em que as pessoas morrem para sempre dentro de nós. 

Autor : María João Lopo de Carvalho
in Adopta-me

quinta-feira, 11 de julho de 2019

Arte de Amar

Marcos Becarri.
...
Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus - ou fora do mundo.

As almas são incomunicáveis.
Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
Porque os corpos se entendem, mas as almas não.

Autor : Manuel Bandeira

quarta-feira, 10 de julho de 2019

Ode da Pele

Rosie Hardy.
.
arrepia
só de pensar que respiras

Autor : Ana Salomé

terça-feira, 9 de julho de 2019

Tenho Saudades de Ti

Joan Carol
Os dias contigo são dias inteiros que passam num instante. Tenho saudades de ti quando acordo, antes de perceber que já estás ali ao meu lado. Tenho saudades de ti de manhã enquanto espero que desças do banho. Fico bem a ler enquanto te espero, mas leio melhor quando estás ao pé de mim, quando já não me apetece ler.

Hoje foi mais um dia contigo e, mais uma vez, dou comigo aqui à noite, separado de ti, para escrever sobre o dia que se passou. E a coisa principal que aconteceu foi ter saudades de ti outra vez.

Bem sei que sei onde estás e que eu estou aqui a cinco passos de ti. Mas a maior certeza que tenho é que, apesar disso tudo, não estou contigo nem tu estás comigo. É o que me basta para ter saudades de ti. Não preciso de mais: se mais tivesse, morreria.

É verdade que estive contigo durante uma pequena parte do dia: aquela a que as pessoas tristes e habituadas chamam vida. Mas estava tão apaixonado e tão feliz que nem dei por isso.

Pensei apenas: "Conseguimos! Conseguimos estar juntos! Nem acredito!" E o tempo nunca é suficiente para me convencer que conseguimos mesmo estarmos juntos e, ao mesmo tempo, estarmos juntos o tempo suficiente para deixarmos de nos preocuparmos (e sofrermos) com isso.

Continuo a sofrer, todos os dias, às mesmas horas em que não estou contigo, da saudade de quando estive. Os dias contigo são os bocadinhos de manhã, tarde e noite que são avaramente permitidos aos mais felizes.

E apaixonados. E ingratos.

Autor : Miguel Esteves Cardoso, in "Jornal Público (26 Mai 2015)"
Título original da crónica: "Os Dias Contigo"

domingo, 7 de julho de 2019

Resisto

Brooke Shaden.

.
Resisto 
Quase moribunda 
A exalar um ultimo suspiro 
A contorcer o destino 
Violento 
Fleumático 

Resisto 
Exaurida 
Escondo-me em palavras 
Que não digo 
Que calo 
E me sufoca a laringe 

Resisto 
Aqui onde o sonho não existe 
Onde o vento me acaricia o rosto 
E onde eu ainda abraço a esperança 
Dormente 
.
Autor : BeatriceMar 2013-07-07

sábado, 6 de julho de 2019

Romance de Nós

Richard Blunt.
.
Estou à beira do mar,
estou à beira de ti.
Ardem no meu olhar
os sonhos que não vi.
Tudo em nós foi naufrágio,
não quisemos saber:
fizemos nosso adágio
do que não pôde ser.
Que resta do amor
a quem é como nós?
Envergonha-me pôr
em verso: «somos sós;
sós como amanhecer
às avessas do mundo;
sós como podem ser
as areias no fundo;
somos sós e sabê-lo
é negar o pronome
que de nós fez novelo
e por nós se consome».

Autor: Luis Filipe Castro Mendes
in "Modos de Música"

sexta-feira, 5 de julho de 2019

Casa suspeita

talvez eu quisesse ser teu lado mais bonito
a parte da tua história mais repleta, plena
a coisa certa
de uma forma tão serena, tão doce
mas que ao mesmo tempo fosse
selvagem e obscena, violenta até.

que o ódio está sempre contido na paixão
e se eu tenho uma paz toda que me enfeita
trago uma casa suspeita dentro do coração

trago um crime que cometi ou que vou cometer
e jogo contra mim, jogo contra você
vivo do perigo de te fazer enlouquecer
no eterno dilema de ser e não ser
ando na beira do que pode acontecer
e morro de medo de te perder.

Autor: Bruna Lombardi

quinta-feira, 4 de julho de 2019

Relógio

O mais feroz dos animais domésticos
é o relógio de parede:
conheço um que já devorou
três gerações da minha família.

Autor : Mário Quintana

quarta-feira, 3 de julho de 2019

Egoísmo

Cyril Rolando..
.
Eu,
estudar apenas
o sentido estético da tarde.

Nem grandes sentimentos,
rolando
em alinhamentos compactos
das reminiscências
dos factos, ou não.

Nunca atitudes suspensas,
vindas de conhecimentos
vastos,
da grande multidão das coisas
com sequência.

Nada.

Apenas eu, estudando
através do gozo de estar ao sol
numa cadeira vermelha
já velha,
o sentido estético da tarde.

Autor_ Glória de Sant'Anna
em Amaranto: Poesia 1951-1983, Lisboa: INC

terça-feira, 2 de julho de 2019

O Medo de Magoar os Outros

John Lautermilch.
.
O medo de magoar os outros é uma invenção da nossa mente. É o pior dos dois mundos: nem tu vives em liberdade de expressão, nem os outros sabem o que te passa no coração e na cabeça acerca deles. Já pensaste que a verbalização daquilo que sentes pode ser tudo o que a outra pessoa também sente mas não é capaz de dizer? Já idealizaste que aquilo que sentes pode ser a tomada de consciência que o outro precisa para reforçar aquilo em que já acredita e mudar de comportamento? Já imaginaste que a materialização daquilo que sabes a teu respeito pode ser profundamente inspirador para quem te ouça ou tenha o privilégio de te ver em ação? Quem te diz a ti que empregar as palavras certas, as palavras que carregam a tua verdade, olhos nos olhos do outro não é algo de absolutamente vantajoso para ambas as partes? Quem? E sim, ainda que possa doer um pouco. A verdade dói quase sempre. O crescimento dos dentes também, certo? E no entanto é vital, não é? Assim se passa com a mente. A evolução da mente de mentirosa para potenciadora passa pela dor, por ouvir certas verdades a nosso respeito, aceitá-las se for o caso e depois treiná-la e orientá-la na direção que pretendemos. Agora, viver na ignorância de acreditar que os outros é que estão sempre certos é que é manifestamente ridículo. Somos pessoas, dependemos de nós mas precisamos sempre dos outros e ficar calado não ajuda nada. Matas-te e fazes o outro acreditar que é dono e senhor da razão. Não dá. Não pode ser. A ti foi-te concedida a oportunidade de viver e inspirar, portanto não vamos abdicar nem de uma coisa nem de outra. Vive e inspira. Apaixona-te e passa a palavra. Respeita-te e comunica. De que adianta viver num faz de conta? Faz de conta que o amo. Faz de conta que sou feliz. Faz de conta que gosto do que faço. Faz de conta que gosto dos meus pais. Faz de conta que não sei. Faz de conta que sim. Faz de conta que não. O que é isto? Sim, o que é isto? É ingrato, é sujo, degradante e desumano. É isto que é.

Autor: Gustavo Santos
in 'A Força das Palavras'