quando antecipamos o voo
antes de terminado o tempo
da aprendizagem das asas
a euforia pela nova liberdade
pode ser amortecida
pela ira dos ventos contrários
se cedo nos atiramos ao mundo
cedo o mundo se atira a nós
e o cansaço acaba por chegar
antes do tempo do descanso
um cansaço tamanho
que nem encontramos memória
do caminho até ele
e cedo
-demasiado cedo-
a vontade de recolher as asas e enrolar o corpo
nos novelos com que fizemos
o derradeiro ninho
um ninho seguro e redentor
feito de abraços maternais
e colos a segurar voos
que não se querem apressados
sabemos que não conseguimos preparar o coração
para os voos dos nossos filhos
porque também eles nos são colo e abraços
e guardam a nossa alma à superfície da pele
onde sentem o ar que lhes faz crescer as asas
é imenso o esforço imensa a ternura
incondicional o amor
com que inventamos planos de voo
planos de sorrisos
planos de ausência de dor
não temos garantias e isso é
totalmente irrelevante
porque os filhos são promessas do universo
e nele se vão cumprir
nós somos apenas grandes braços
que se desdobram em mãos de amparo
um dia partem
como nós partimos
e ainda assim vão ficar
como nós ficámos
só os filhos são capazes de ir
e ao mesmo tempo
ficar
Autor : Rosário Ferreira Alves
in lunaris, Poética Edições 2016
Imagem : Duong Quoc Dinh
1 comentário:
Poema deslumbrante que muito me emocionou ler.
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Saudações cordiais e poéticas
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Pensamentos e devaneios poéticos
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