Mãe, oxalá eu nunca tivesse largado a tua mão:
com o menino ao colo, fez-se a estrada maior do
que o meu desespero, amarrotou-se de velho meu
coração tao claro. Eu tinha catorze anos antes
do estrondo, catorze anos e meio antes do teu
grito, quinze anos cumpridos quando afastei o
véu dos teus cabelos: se me dizias sempre que não
fosse para longe, porque pediam o contrário os
teus olhos parados? Ainda por cima, mãe, chegar
ao campo foi como bater a uma porta cansada -
mil tendas que eram velas remendadas, barcos para
ficar de novo pelo caminho. Trouxeram-nos mantas
cheias de perguntas; tentaram-me com doces
para me pôr no lugar; mudaram ao meu irmão
a fralda com as mãos frias. Mãe, eu disse-lhes que
o menino era meu; e agora, quando ele procura os
teus seios no meu corpo sem formas, cubro com
teu véu os meus cabelos e canto-lhe baixinho
canções de açúcar. Não sei que idade tenho, mãe,
mas oxalá eu nunca tivesse largado a tua mão.
*
Autor : Maria do Rosário Pedreira
in O Meu Corpo Humano
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