Um dia deixarei para sempre o casaco no cabide da entrada
outras mãos que não as minhas haverá para o recolher
outros olhos pelos meus lhe hão-de fitar depois a ausência.
Depois, nem isso.
Há um momento em que se estende a toalha sobre a mesa dos mortos
como se tivesse sido sempre a mesa dos vivos. Esse dia virá.
Tudo então estará certo e limpo como o esquecimento.
Ou quase assim.
Dispo agora toda esta roupa e escrevo
– sem frio nem perda nem desastre –
a partir desse dia que virá, esse dia depois de mim:
lírios crescem no acaso vivo da relva
uma leve poeira se acrescenta ao ar que não respiro.
Autor: Rosa Maria Martelo
in “Matéria”, Editora Averno, Lisboa, 2014
Pomos a esperança num futuro que não conheceremos.
ResponderEliminarAbraço.
Bela flor. Lindo poema. A conjuntura poética perfeita.
ResponderEliminarCumprimentos poéticos